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domingo, 6 de abril de 2008

O mal, os católicos e a revista Veja

Do BLOG DO ANGUETH
Domingo, 06 de abril de 2008

Na edição desta semana (Edição 2055, 9 de abril de 2008), a reportagem de capa da Veja é: O mal – Uma investigação filosófica, psicológica, religiosa e histórica sobre as origens da perversidade humana.

O título é assaz pretensioso para uma reportagem de 4 míseras páginas. Entendo que, por razões mercadológicas, a revista limite suas reportagens. Mas que ela então limite também seus títulos.

A reportagem se concentra nos casos de maldade contra crianças, mas não consegue esconder seu anti-americanismo notório ao ajuntar num mesmo parágrafo o que ela chama de “infame caso de tortura em Abu Ghraib” e o Tribunal de Nuremberg, “que julgou líderes nazistas, não aceitava a obediência a ‘ordens superiores’ como justificativa para crimes de guerra”. Que maneira mais sutil de igualar a invasão do Iraque à invasão hitlerista da Europa!

A investigação histórica mencionada no título fica relegada a uns quadros que aparecem ao pé de três das quatro páginas da reportagem, com o título Um Enigma Profundo: os principais marcos na história do pensamento sobre o mal.

A primeira frase do primeiro quadro (O mal na religião) é um pouco ambígua: “Todas as religiões compreendem alguma força de desordem ou destruição – o Mal”. Meu “Aurélio” me diz que compreender pode significar “conter em si, constar de, abranger, incorporar, englobar, incluir” e também “alcançar com a inteligência, atinar com, perceber, entender”.

Desconfio, e logo digo a razão, que a Veja quer dizer que “todas as grandes religiões” contêm em si, incorporam, incluem, “alguma força de desordem ou destruição” como explicação para a origem do mal do mundo. Falo isso porque tenho a convicção que todos que, atualmente, não são católicos conhecedores da tradição da Igreja, tendem para uma forma ou outra de Gnose. A Gnose é uma antiqüíssima idéia de que há, no mundo, a ação, ou a guerra de dois deuses: o do Bem e o do Mal. Acho assim, mais provável a explicação gnóstica do verbo compreender usado pela Veja.

Hoje em dia, as pessoas professam a gnose sem o saber. Existe uma bibliografia enorme a respeito, começando pelo Adversus haereses de Santo Irineu, onde o autor dá nome à coisa, a descreve nos mínimos detalhes e depois apresenta argumentos contrários á gnose. É um livro obrigatório para a compreensão da doutrina gnóstica.

Mas, atenção: a gnose é apenas uma das várias tentativas que o homem inventou para explicar a presença do mal no mundo. Existem outras que menciono mais abaixo. A Veja identifica a origem das idéias gnósticas (sem dar o nome à coisa) no Zoroastrismo que, diz a revista, “pode ter influído sobre o judaísmo e o cristianismo”. Logo depois, fala sobre o Gênesis, como a sugerir uma certa continuidade do Zoroastrismo. Menciona a serpente de Éden e nos avisa que “o Satã do Antigo Testamento ainda não é exatamente um opositor malévolo de Deus”. O “ainda” da frase é totalmente gnóstico, pois, para nós católicos, o demônio nunca foi opositor de Deus. Ele é apenas um ser criado e só atua quando Deus assim o permite. O demônio só é um opositor de Deus na Gnose, onde ele assume o estatuto de criador. Para o católico, não há opositor a Deus, mas apenas quem não aceita Seus desígnios. Deus é o Ser Supremo: “Eu sou Aquele que sou”.

A revista cita ainda Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino sem lhes dar a devida importância, como dois dos que tentaram explicar a presença do mal no mundo. Cita ainda Leibniz, Darwin, Aristóteles, Maquiavel, Kant, Nietzche, Arendt. Como fechamento da parte histórica, cita a neurociência e o mapeamento cerebral dos psicopatas.

A neurociência, usando a autoridade que a ciência adquiriu no último século de dar palpite em tudo, tenta reduzir todos os valores morais à pura química cerebral. Seria útil ler A Neurociêcia Refuta o Livre-Arbítrio e A Neurociência Refuta a Ética. Não é pouco significativo que a Veja tenha terminado a seção sobre “os marcos na história do pensamento sobre o mal” com a referência à neurociência. A idéia é mesmo que a ciência vá resolver o problema do Mal no homem. Isso já não é gnose, mas o mais irredutível materialismo adicionado a quantidades industriais de soberba.

O que dizer da historinha que a Veja nos conta. Bem, além do que eu já disse, digo ainda que ela é mais significativa pelo que ela não nos conta. Fico aqui apenas com o mais significativo evento que ocorreu na História da Humanidade em relação à organização institucional das forças do mal contra a civilização humana. Trata-se da heresia que foi chamada de Albigense, ou a heresia dos cátaros. Esse foi um movimento herético medieval que quase triunfou e se assim tivesse acontecido, a civilização teria perecido. Não mencionar um evento de tais proporções numa história dos marcos sobre o mal é não entender a essência do mal. É comum que quem não entende a essência do mal fique abestalhado com a sua diversidade: “Qual é o teu nome. Ele respondeu: Legião!” (Lc. 8,30). Mas para compreender a essência do mal é preciso ter a graça do “discernimento dos espíritos” de que nos fala São Paulo (I Cor. 12, 10). E quem de nós tem essa graça atualmente?

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