Do blog MÍDIA SEM MÁSCARA
por Manuel Marlasca e Luis Rendueles em 02 de dezembro de 2007
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O Fabio Gallipolli, um pequeno barco pesqueiro patroado por Juan José Mata, foi abordado pela polícia espanhola em águas do Cabo Verde em maio de 2006. Em sua adega levava quase três toneladas de cocaína. Seus tripulantes foram detidos e presos. O juiz de La Orotava (Tenerife) encarregado do caso escutou atônito as declarações de dois dos marinheiros-narcos. Eles lhe contaram que a droga lhes havia sido entregue em alto mar por uma patrulheira da Armada da Venezuela. No mesmo submarino dessa operação, chamada Butreque, a Polícia e a Guarda Civil escutaram uma conversa entre os narcos. Um deles mostrava seu temor em voltar à Venezuela para saldar uma dívida. O outro o tranqüilizava: “Agora o chefe é o irmão”, em alusão, segundo fontes da investgação, a Marcos Chávez, irmão do presidente venezuelano Hugo Chávez Frías, nomeado comisário geral da CICPC (Corpo de Investigações Científicas, Penais e Criminalísticas), o corpo policial de elite venezuelano encarregado, dentre outras coisas, de reprimir o narcotráfico.
No melhor dos casos, a negligência de Chávez e seu regime com os narcos é notória. Informes do CICO (Centro de Informação sobre o Crime Organizado) espanhol descobriram que 80 por cento da cocaína que chega à Espanha já procede da Venezuela. “Não parece que incomode a Chávez inundar de droga a juventude espanhola burguesa e podre, segundo seu discurso ideológico”, assegura um dos investigadores. Outro dos agentes espanhóis anti-droga lembra que antes de Chávez, “apenas 20 por cento da coca vinha da Venezuela; a maioria saía de praias colombianas caribenhas. Porém, com ele no poder, no mínimo se triplicou”. Agentes espanhóis estão esta semana na Venezuela tratando precisamente de melhorar a colaboração na luta anti-droga, quase órfã desde que Chávez expulsou a DEA, a toda-poderosa agência americana, em 2005.
É precisamente a DEA a autora de informes em poder da Polícia espanhola que afirma que a Armada venezuelana escolta com seus patrulheiros os barcos carregados de droga, enquanto sulcam o delta do rio Orinoco até a desembocadura. Os agentes espanhóis não confirmaram essa denúncia, porém relatam várias histórias: a do carregamento de 175 quilos de coca que agentes da Guarda Nacional haviam colocado no porto de Guaira. Esse mesmo grupo já havia enviado 1.300 qilos de droga que foram localizados pela Guarda Civil em Madri e Lisboa.
Os últimos barcos com coca até na cozinha, apreendidos pela Polícia e Guarda Civil desde 2003, passaram pela Venezuela. Foi o caso do Gallipolli e também do Caridad C (outras três toneladas) e do White Sands (3.100 quilos de droga). Este último tinha como destino o Senegal, onde os grandes narcos já têm infraestrutura. De fato, a Polícia espanhola detectou em alguns países africanos, como Marrocos e Togo, a presença de prováveis homens de negócios com passaportes venezuelanos dedicados na realidade ao tráfico de cocaína.
Não apenas a Espanha tem se queixado de que Chávez faz vista grossa à droga. Também se queixou a Colômbia, local de saída da coca. Assim, um recente informe do Governo colombiano afirma: “A organização de empresas narcotraficantes formadas por redes de colombianos e venezuelanos, permitiu aproveitar a experiência acumulada na Colômbia para converter a Venezuela em exportador de drogas ilegais de primeira ordem para a Europa e Estados Unidos”. O diário colombiano El País informou em julho deste ano que a droga procedente da Venezuela para a Europa e México havia aumentado uns 500 por cento sob o mandato de Chávez. Segundo informação deste periódico, na Venezuela já há 117 pistas clandestinas no delta do Orinoco nas quais aterrizam aviões com coca para carregá-la nos barcos. Também o Governo mexicano se queixou da lassidão venezuelana com a cocaína e os vôos para seu país. Tampouco teve êxito.
Não é por acaso que Chávez também mantenha fluidas relações com as FARC, guerrilha colombiana financiada com a cocaína e com os seqüestros. Inclusive Chávez ofereceu-se para mediar com eles a libertação de alguns dos seqüestrados. Tampouco é por acaso que quase todos os grandes narcos tenham um passaporte venezuelano. A Polícia espanhola confirma que “os narcos colombianos compram passaportes venezuelanos em branco. Dessa forma, evitam ter que pedir visto para viajar para a Europa”. Foi o caso de Orlando Sabogal, codinome “Mono”, chefe do cartel do Norte del Valle, que foi detido pela Guarda Civil no ano passado em Madri.
O primeiro caso de um traficante de droga internacional com conexões diretas com o regime, foi o de Walter del Nogal, detido em setembro na Itália, por tráfico de cocaína, segundo publicou El Nuevo Herald. Del Nogal havia chegado a Milão desde a Espanha e era foragido da justiça suíça. Quando Chávez chegou ao poder, Del Nogal estava na prisão cumprindo condenação por assassinato. O presidente o indultou e Del Nogal converteu-se em um homem agradecido e que freqüentava festas dos vips do regime. Em uma dessas festas posou radiante junto do prefeito de Caracas, Juan Barreto.
Na estrutura do regime
Os serviços anti-droga espanhóis não estão nada contentes com Chávez, tampouco os grupos anti-terroristas. Por um lado, organizações fundamentalistas islâmicas violentas, como o Hamas e o Hezbollah, já têm escritório e simpatizantes na Venezuela. Por outro lado, mais estritamente espanhol, o assunto dos etarras que vivem na Venezuela, muitos desde os anos 80. “O que mudou com Chávez é que os etarras antes eram empresários privados que financiavam desde lá; agora, muitos estão integrados na estrutura do regime e se uniram com outros procedentes do México, desde que o Governo mexicano começou a colaborar conosco. Alguns cobram de governos e municípios controlados por chavistas, inclusive. E todos têm passaporte venezuelano”, assegura um agente anti-terrorista.
A cabeça visível dos etarras na Venezuela é Arturo Cubillas, acusado de três assassinatos entre 1984 e 1985, quando fazia parte do Comando Oker. Cubillas refugiou-se na Venezuela em 1989 e abriu um restaurante ao qual chamou - como seu grupo assassino, no qual compartilhava pistolas com Idoia López Riaño -, La Tigresa. Na Venezuela Cubillas casou-se com Goizeder Odriozola, filha de exilados bascos. Em 2005, o governo de Chávez o nomeou diretor de Bens e Serviços do Ministério da Agricultura. Sua esposa passou do mesmo ministério a converter-se em diretora geral do Despacho da Presidência, uma espécie de gabinete de Chávez. Ficavam para trás as extradições em 2002 de Sebastián Etxaniz – condenado por três assassinatos – e Juan Víctor Galarza. O Governo de Chávez retificou essas extradições de imediato e ofereceu pagar 325.000 euros de indenização, embora depois tenha anunciado que não o faria.
Na Venezuela vivem comodamente, segundo informes anti-terroristas espanhóis, Miguel Ángel Aldana, codinome Askatu – acusado de dois assassinatos -, María Arana Altuna, Carmen Albizu Etxabe... até uns quarenta etarras. Alguns, os mais afortunados, trabalham para bandos chavistas. Outros dirigem uma armaria e inclusive dão aulas de tiro e táticas de guerrilha aos círculos bolivarianos. “Eles podem ensinar muitas coisas de guerrilha e ‘kale borroka’ ao contrário a essa espécie de ‘somatén’ ou milícia que Chávez usa para destruir mobilizações da oposição”, afirmam fontes policiais espanholas. Os Círculos Bolivarianos reprimem com dureza, e com armas, as manifestações da oposição contra o projeto de Chávez de poder ser reeleito por toda a vida, previsto para 2 de dezembro.
Os etarras vivem na Venezuela nos estados Falcón, Sucre, Nueva Esparta e Aragua, segundo os informes anti-terroristas espanhóis, que acrescentam com preocupação que alguns etarras conseguiram ser eleitos diretores das euskaletxea (casa basca), verdadeiro centro nevrálgico da emigração. São os casos de Barcelona, Puerto La Cruz, Anzoátegui, Sucre e Falcón. Além de militantes do ETA, Chávez mima seus simpatizantes e entorno próximos, especialmente a organização Askapena (Libertação), que afirma em seus documentos fazer parte do Movimiento de Liberación Nacional Vasco (MLNV), a forma em que o ETA e seu entorno se auto-definem. Membros do Askapena mantêm excelentes relações com o regime chavista e participaram lá, do mesmo modo que o dirigente de Batasuna, Joseba Álvarez, no Fórum Social Mundial que celebrou-se em Caracas no ano passado. O Askapena também colaborou na inauguração da emissora de rádio de apoio a Chávez chamada “Al son del 23”.
No verão passado, um grupo de jovens independentistas bascos viajou à Venezuela com o nome de Brigada. Em suas crônicas afirmaram que iam “transmitir o que é a Euskal Herria, nossa luta e nosso projeto”. Foram entrevistados na emissora, também na rádio estatal venezuelana e visitaram várias coordenadoras chavistas. Um fotografia na internet mostra vários dos voluntários da Askapena posando sob um enorme retrato de Simón Bolivar e com um cartaz no qual se reclama o regresso à casa (etxera) dos presos etarras. Outro membro da Askapena, Luismi Uharte, assina artigos de apoio a Chávez como “professor ad honorem da Universidade Central da Venezuela”.
Chávez e seus aliados empregaram membros da Askapena para se defender, inclusive, de problemas locais. Desse modo, integrantes da Askapena viajaram à Bolívia no verão passado e deram entrevista coletiva de imprensa em 23 de agosto em El Alto. O Governo de Evo Morales passa por dificuldades ante a mobilização popular majoritária no estado de Santa Cruz, que reclama um estatuto de autonomia similar ao basco ou ao asturiano. Morales vem sofrendo massivas manifestações contra si.
Os brigadistas bascos chegaram até aqui para explicar, segundo suas próprias palavras, que a “Euskal Herria é uma nação sem Estado sob o domínio do Estado espanhol e francês”, que “o nosso é um povo que foi colonizado; quando em 1512 [data da incorporação de Navarra à Espanha] os colonizadores espanhóis chegavam à Bolívia, começava também a última ofensiva contra a soberania de nosso povo”. Após a heróica história, o chamamento aos bolivianos: “A autonomia significou a concessão à oligarquia local de quotas de poder para defender seus interesses econômicos e administrar seus negócios. Este regime autonômico é um obstáculo no caminho para a recuperação de nossa soberania”. Quer dizer, nada de autonomia para a Bolívia. A fluidez de relações entre o regime chavista, seu “irmão mais novo” Morales e alguns setores independentistas radicais bascos mostra-se também com a existência em Bilbao, desde 2004, do Círculo Bolivariano La Puebla, que se define a si mesmo como “conformado por bascos/as, venezuelanos/as e outros/as interessados/as em apoiar a Revolução Bolivariana que se está levando a cabo na Venezuela” e faz fincapé nas raízes bascas de Bolívar.
Não estranha que, com tanta comunicação ideológica, quando Chávez protagonizou o incidente com o Rei de Espanha a televisão pública venezuelana tenha entrevistado José María Esparza, ex-editor de Gara, para que desse sua opinião: “O Rei não tem maior representatividade do que a que lhe condece o ditador Francisco Franco... O povo basco e o catalão jamais votaram pela permanência do Rei” .
Fonte: http://www.interviu.es
Tradução: Graça Salgueiro
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